sexta-feira, 24 de junho de 2011

Sob o Olhar Celta

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Ao meu Orvalho, DEDICO.

Trilha Sonora Sugerida "Celtic Awesome Song", versão Corciolli-Highlander




Fim de tarde e eu estava em casa. Parte de mim sempre esteve ali e eu sabia. Me prostrei diante da água do mar celta e dos meus ancestrais, e aspirei o ar que vinha do Mar da Irlanda. Meus pés pisaram naquele solo e fixaram raízes e, apesar do frio, me mantive descalça. Eu podia sentir a força da terra e energia daquele lugar. Olhei para o horizonte e vi o calor daquele por do sol tão lânguido e supremo. Era o fogo. Os quatro elementos da natureza estavam todos dispostos e a minha disposição, como um presente dos druídas.

Eu não sei, para ser franca, se ele entendia o que estava acontecendo ali, mas, soube respeitar. Manteve-se no mais absoluto silêncio, me observando com uma ternura inescapável. Aquele lugar, aquela energia tinham que ser compartilhados com alguém e não consigo imaginar outra pessoa. Ele era sofisticado e singelo como aquele momento e olhar aqueles olhos verdes contra aquela luz límpida me enchia de um amor que estava para além do sentimento que se brota nas relações que nos estabelecemos. Tinha que ser ele ali...

Sentamo-nos nas pedras e assistimos, lado a lado, aquele fim de tarde. Não nos tocamos, falamos e nem fizemos gestos bruscos. Contemplamos com olhos, pele, ouvidos, pulmões e coração. Não sei quanto a ele, mas, a felicidade que brotava dos meus poros era perceptível ao mais desatento rochedo próximo do despenhadeiro. Olhei novamente nos seus olhos enquanto ainda existia um feixe de luz que permitisse ter visão e enxerguei, dentro do meu Orvalho de Hermon, a paz e felicidade também. Talvez eu o tivesse subestimado. Talvez ele estivesse tão imerso naquela onda de energia daquele lugar quanto eu.

Quando o sol finalmente se escondeu, caminhamos pela trilha em direção ao castelo e ao altar celta. Havia dito a ele que o queria em minha casa, sentindo minha alma, disposto e exposto aos meus ancestrais não como uma oferenda, mas como uma partilha de energia, de amor, de amizade e de vida. Ele não e opôs. Sequer perguntou o que seria esse momento. Apenas confiou em mim e seguimos andando pela trilha, já escura, iluminada apenas por uma imensa lua cheia envolta em luz branca e dourada, marcando a presença de outras como eu.

A temperatura caia ainda mais a medida que avançávamos. Ele me posicionou em sua frente e lançou seu braço direito sobre meu tórax, abaixo do pescoço e acima dos seios, como sempre fazia quando desejava acalentar, cuidar ou proteger alguém. Nosso passo desacelerou e se alinhou, mas, continuamos assim até o cume.

Ao chegarmos, o altar de pedra estava pronto, como se esperasse por aquele momento há 3000 anos. O mar que se lançava contra as pedras na arrebentação e o vento que açoitava as árvores com a delicadeza seriam a trilha sonora daquele momento. O sentei no altar e segurei seu rosto entre as mãos. Acariciei sua pele, cabelos e desenhei o contorno dos seus olhos com os dedos. Disse "fica aqui" e ele assentiu com a cabeça. Caminhei ao depósito e peguei algumas lascas de madeira que estavam empilhadas. Sem dificuldade alguma a madeira queimou e o fogo brotou. Apanhei um punhado de terra e um pequeno arbusto salpicado de orvalho e me dirigi a fogueira. Ergui minhas mãos e pedi protenção à Deusa Mãe. Queria conforto e paz, saúde e felicidade para mim e para aquela alma doce e terna ao meu lado que observava tudo com uma expressão de calmaria. Salpiquei a água no fogo, joguei o punhado da terra e soprei o ar vindo do mar. Um fumaça com cheiro de cedro desenhou o ar formanda arabesco que o vento lançava contra nós.

Me aproximei dele mais uma vez... Tirei o seu casado e a camisa e pude ver os pêlos eriçados de frio. Me abaixei diante dele enquanto ele me fitava com o olhos e, calmamente, retirei seus sapatos e meias. Me ergui novamente e afrouxei seu cinto, me desvencilhando do jeans e de sua roupa íntima. Ele nada fez. Apenas me observava com candura. Quando terminei, beijei seus olhos, aqueci e envolvi minhas mãos no calor do fogo e na fumaça e o toquei de baixo para cima, até alcançar seu rosto. Quando terminei, me afastei e contemplei aquele olhos incomparáveis.

Em um movimento suave, ele repetiu meus gestos. Me despiu, aqueceu suas mãos e me tocou exatamente na mesma sequência de antes. Quando terminou, envolveu meus rosto entre suas mãos e beijou-me os olhos.

Quando minhas pálpebras de afastaram, o que vi foi um homem encantador, doce, terno, gentil e dotado de uma singeleza ímpar. Atrás dele, a Deusa Mãe, o vento o fogo e a fumaça que agora se lançava com mais volume em nossa direção... Sem certeza alguma do que deveria fazer, esperei... Ele franziu o cenho como se esperasse alguma resposta e, diante da minha imparcialidade das minhas feições, ele me abraçou. Ficamos pele a pele e eu podia sentir cada depressão e relevo do seu corpo. Cada pêlo eriçado. Cada distenção e recuo do seu tórax junto ao meu quando ele respirava. Senti meus seios contra o seu corpo e aqueles braços que me envolviam de canto a canto. Não havia nada de sexual ali, nada de lascivo, nenham maldade. Tampouco soube explicar o que era. Sentia-me livre, plena e repleta de uma energia que precisava ser dissipada de outras formas, porque meus poros já não eram suficientes para essa tarefa. Ele sentiu o mesmo, porque percebeu a inquietude que agora se apropriava do momento.

Lágrimas percorreram meus rosto até morrer em minha boca. Ao vê-las, ele caminhou com seus lábios por esse trajeto e terminou em minha boca, onde se apropriou do que restou daquelas gotículas. Toquei as lágrimas que caíram do outro lado do meu rosto e desenhei o mesmo trajeto no rosto dele. Com os lábios, fiz a mesma sequência que ele me proporcionou e nada mais ali era importante.

Naquele instante, o vento se acirrou e varreu as árvores próximas, lançando gotículas de orvalho e grãos de areia por todos os lados. A madeira estalou e pequenas fagulhas de fogo se ergueram do chão, misturando-se a àgua, ao vento, a terra e as folhas que flutuavam naquele espiral. Eram elas, as outras iguais a mim que mostravam que o ritual estava terminado, que a natureza havia recebidos o meu pedido e que o universo agradecia a minha fé. Era inexplicável aquele momento e só me restava agradecê-lo por me acompanhar e se doar a mim e aos meus.

O vento diminui enquanto a madeira dava os seus últimos suspiros. Afrouxei os meus braços que se enlaçavam sobre o corpo dele e pensei em cada uma das possibilidades, mas não cheguei a conclusão nenhuma. Poderia fazer amor com ele naquele momento, sem que isso representasse que aquela criatura era o homem da minha vida quando, na realidade, ele era a alma daquele momento. A gente pode passar o resto de vida ao lado de alguém com quem partilha uma vida, mas não necessariamente a nossa essência e a nossa alma. Qualquer homem poderia seguir comigo rumo ao fim dos nossos dias, mas ele era o único que poderia sentir aquele momento comigo.

Poderia tê-lo vestido e dormido naquele altar até o sol despontar no horizonte novamente. Poderia, ainda, levá-lo para dentro do castelo, acender uma lareira e tomar vinho até o frio passar. O que aconteceu naquela noite, no entanto, não ousaria dizer até que ele me pedisse, porque há coisas nessa vida que a gente deve guardar nas nossas entranhas em respeito a nós e em respeito aos que visitam a nossa alma.


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